segunda-feira, 15 de setembro de 2008

conto besta de uma Coleção de ventos

De todos os tipos de ventos estranhos que colecionei, esse foi o mais gostoso. Eu não entendo muito bem porque, por mais experiente que seja com eles, os ventos, nunca analisei nada como sua origem, massas de ar e coisas desse tipo. Disso não sei absolutamente nada, mas sei senti-los mais do que sei sentir qualquer outra coisa. O que eu percebi é que a situação sempre colabora e isso torna meu hábito ainda mais bonito. Percebi porque se fosse escolher alguns pra destacar seriam dois, esse a que me referi e meu primeiro vento de verdade.
O primeiro era simples. Sítio da família, finais de semana ensolarados, minha infância e um pé de jaboticaba. Era sentar lá e sentir o vento forte no rosto, às vezes comendo da fruta direto do pé, às vezes brincando com a colher na terra, às vezes tanta coisa. Senti como o vento era bom ali e passei a querer senti-lo em todo lugar.
E passei. Tanto que me apaixonei por isso, e pelos meus filmes em que os cabelos voavam e eu podia quase sentir o vento de lá aqui. Meu sonho era o vento do trem, mas o mais perto que cheguei foi o vento do carro.
Viagens eram sinônimos de novos ventos, novos ares e mais paixões. Uma amiga me disse para anotar. Para anotar cada vento e sua descrição. Tentei, mas não dava certo, perdia horas escrevendo, tentando chegar perto da sensação do vento, e assim perdia cada brisa imperdível e ia me perdendo dentro de mim. Tiram o vício e a gente se perde, é assim.
Meu outro vento predileto foi mais complexo. A situação toda era tão maior que não dá pra entender só com minhas palavras secas.. na minha pré-adolescencia, em que eu só sabia ler pra depois sonhar com o que tinha lido, eu queria uma paixão. Queria logo um amor arrebatador, mesmo que sofrido, mesmo que platônico, mesmo que distante. Eu queria sentir o que lia, e pra isso precisava de toda alegria e dor de ter um amor.
Tentava amar tudo. Tentei vizinhos, colegas de sala, meus dois irmãos e até meu pai. Cheguei perto com um estranho de cabelos cacheados que vi no metro, mas o vi dizendo que odiava abelhas e não sei porque naquele momento fui tomada por uma adoração imensa as abelhas, não conseguindo me apaixonar por ele.
Quase que carente, desesperada por sentir, desci de bicicleta um morro enorme do meu bairro, coisa que eu fazia todos os dias. Fazia e no fim sentia junto com o vento aquele cheiro de pipoca da praça. Era minha paz. Mas num tal dia em que, por motivos desconhecidos mas com certeza muito importantes, o pipoqueiro não fez sua pipoca, eu desci. Desci e senti um vento com cheiro de nada, de criança, de árvore, de perfume vagabundo. Com cheiro da falta de cheiro de pipoca. De chão, poeira e água. Chuva, calor, gente. Senti um vento com cheiro de vento, vento puro na mistura que ele é, e me senti parte daquilo, do meio, do cheiro, do vento. Me senti parte do mundo e me senti parte do amor.
Devia ter voltado e descido o morro de novo. Mais umas cem vezes, mil. Até que virasse vento com cheiro de mim.

Um comentário:

Unknown disse...

Te prestigiarei porque te amo!